terça-feira, 18 de setembro de 2012

O gato, o Lawrence Olivier de bigodes!



O gato é o artista do palco por excelência, o ator dos atores, o Lawrence Olivier de todos os tempos. Frente ao gato não há Cacilda Becker ou Paulo Autran que resista. Em cima do tablado é o gato que reina, enquanto nós, sapiens, naufragamos. O gato olha de soslaio para Édipo e diz: ‘mas que menino mais bobo, matou papai e casou com mamãe!’ Meow! Só um gato para dar conta da potência trágica de um herói grego! Faça o teste e vá assistir no teatro a história protagonizada pelo rei de Tebas na pele de um gato galante. Ator nenhum consegue convencer a mais generosa das plateias com a famosa cena da perfuração dos olhos. O ator humano se esbugalha em cena, berra, grita, chora, corta as tripas na tentativa de transmitir o horror da situação e conclama a audiência para compartilhar da sua interpretação de toureiro com hemorróidas. O gato não. Com o gato a coisa é bem diferente. O gato é econômico. O andar do gato já carrega todo um caminhão de emoções contidas num simples desfilar de patas acolchoadas. O gato é elegante, um mentiroso profissional que jamais exagera em nada. O gato não dá a mínima para nossas crises melodramáticas, ao contrário, o gato passa longe do Leblon do Manoel Carlos e sobe direto ao monte Olimpo. O gato é trágico. O ‘ai de mim’ nada mais é do que uma triste tentativa humana de traduzir o lamento de um felino grego, proferido aos ouvidos de Sófocles. Um único ‘meow’ tem a capacidade de derrubar uma plateia, já a ladainha das frases humanas quase sempre vira uma cantilena interminável que dói nas orelhas dos ratos e morcegos, habitantes dos bastidores de todo teatro. Foi depois de ouvir um ‘meow-miau’ que Aristóteles formatou a sua teoria da função catártica do teatro antigo. Gato nenhum se permite entrar na mansão do Tufão e da Carminha. Todo gato sabe que novela, seja ela Mexicana ou Tupiniquim, não está à altura do seu magnífico domínio da cena. Novelas e séries de TV se dirigem a qualidades artísticas inferiores as do gato. Cães e humanos cabem perfeitamente na categoria de personagens moldadas no formato Maria-do-Bairro. Labradores são sempre melodramáticos. Investigue o curriculum de um labrador e verá que o focinho freqüentou o Studio Fátima Toledo ou a Escola de Atores da Rede Globo. O gato ri dessa bobagem toda. O gato sobe ao trono da magnificência dramática, não se rebaixa a figuras medianas freqüentadoras de padarias. O gato é o proprietário do teatro, nós os tristes inquilinos. Shakespeare só foi capaz de compor a sua monumental obra porque afagava um gatão peludo que ronronava no seu colo enquanto escrevia o ‘ser ou não ser [meow] eis a questão’. Se houvesse um teste vocacional que reunisse homens e gatos, não haveria qualquer chance para nós, humanos aspirantes à arte de Dionísio. É o gato o dono da ancestral arte do fingimento. Inevitável persistir. Não há curso de interpretação que nos faça sequer raspar o talento dramático de um bichano de bigodes longos. Pobres mortais de consciência desenvolvida! Queimem os métodos, fechem as escolas, tapem os ouvidos para a tonelada de teorias e... comprem um gato! O gato é o mestre da cena. O gato, só o gato! 

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