Senhoras e senhores, descobri a fórmula da burrice!
Confio-vos secretamente o segredo desse meu monumental achado com a condição de
não surripiá-lo de mim, outorgando a vós aquilo que por direito cabe a minha
honesta e elegante pessoa! Senhoras e senhores, estou animadíssimo com minha
habilidade investigatória no campo antropológico-científico da análise
programática da mentecapice-aguda, e confesso-vos que ainda não tive tempo de
lavrar a autoria disso que eu chamo de Eureca-dos-Estúpidos, tão prontamente me
dispus a retornar da minha pesquisa de campo para contar-vos o que vi numa
simples e ingênua ida ao cinema. Como acabo de dizer, estava eu indo ao cinema
quando ultrapasso com meu potente veículo um carro que no mais último volume
repercutia um funk desses do tipo ‘vai pro chão, vai pro chão, dêxa eu vê seu
popozão – hu hu hu hu’. O som era tão alto que uma possível nave espacial que
estivesse nas redondezas tentando contato com nossa paquidérmica raça humana
voltaria para Marte com o seguinte recado: ‘Bora arrancar o disco voador pra
Júpiter porque pelas bandas da Terra a coisa anda feia’. Senhoras e senhores, a
primeira unidade integrante da fórmula da burrice é justamente o barulho,
porque tudo o que é burro precisa de alto-falantes para polvilhar sua canastrice
acéfala pelos mais variados recônditos ambientais; e sobre isso há uma prova
irrefutável – já que é preciso, como todo cientista de respeito, avaliar as
hipóteses e julgar as provas e contraprovas nos seus mais diferentes casos e
cenários laboratoriais - que consiste em
imaginar outro sujeito testando os tímpanos alheios, mas dessa vez, ao invés do
funk-do-popozão, estivesse compartilhando dentro do mesmo veículo a Nona
Sinfonia de Beethoven, tudo no mais alto volume. Não, senhoras e senhores, Beethoven
e sua turma das cordas, sopros e metais, está longe de precisar da cumplicidade
do vizinho ao recorrer às orelhas públicas o sentido de sua existência. Um
desgraçado nessa posição de divulgador da Ode à Alegria seria imediatamente
internado no manicômio mais próximo, muito diferente do seu parceiro do
Pancadão, idolatrado em comício político por fazer rebolar um sem número de
pessoas. E aqui chegamos à segunda unidade da fórmula da burrice: a multidão.
Senhoras e senhores, todo bando é burro, e basta adicionar barulho nessa muvuca
para que as moléculas da estupidez comecem a cantar em refrão. Explico. No
mesmo trajeto de ida ao cinema – que agora reconheço ter sido um atalho à
sapiência dos falidos de QI – me deparo com uma fila homérica de carros em
marcha lenta à espera de um lugarzinho no estacionamento de um show caipira.
Senhoras e senhores, prestem bem atenção: mais de milhares de almas isentas de
massa cinzenta aguardavam pacientemente sua vez de gastar seu rico dinheirinho
para testemunhar uma dupla de sertanejos universitários a tremer o gogó na base
do ‘Eu me amarrei-hey, eu me amarrei-hey, eu me amarrei no seu coração, eu me
amarrei!’. É uma epidemia! Onde houver uma aglomeração, podeis ter certeza meus
senhores, o alvo da querela será inevitavelmente um troço de fazer rolar de rir
o sujeito minimamente instruído na arte do bom senso. Até aqui, respiremos um
tiquinho para avançar com todo ímpeto que o ensejo merece, temos duas unidades
da nossa equação da burrice: o barulho – sendo traduzida pela necessidade vital
de se gritar ao longe para que o Papa ouça: ‘Eu sou uma Anta-Lobotomizada’ –, e
a multidão – se quiserdes inteligência, não será na Rua 25 de Março que
encontrareis! Enfins – cunho agora esse intratável plural inexistente porque no
meio de tanta tolice ninguém é de ferro -, enfins, para concluir, basta
adicionar calor ao barulho e à multidão que teremos como resultado o surgimento
de um exemplar amebal, produto de tudo o que é estúpido, banal e fugaz.
Senhoras e senhores, que me desculpem os apreciadores do Piscinão de Ramos e
cercanias tropicais, mas o calor corrompe; bote o Dostoievski com os pés na
areia de Ipanema e o russo vira imediatamente um vendedor de canga... nenhuma
inteligência resiste ao coco tostado.
Barulho + Multidão + calor = desentupidor de pia na testa!
Ah, descobri a fórmula da burrice! Nada de surrupiá-la de mim! Sou um gênio!
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