quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

OS CUSTOS DE UMA VIAGEM QUE NUNCA SE FAZ!


Se a ideia é viajar, esqueça do ser viajante, e ponha-se imediatamente na estrada! Viaje logo, antes que a viagem se perca na ideia de viajar... 

Porque hoje se dedica eternidades a preparar quem se viaja, ao custo grave de nunca viajar, sempre prorrogando o movimento para certificar-se de que quem o fará está devidamente preparado para os riscos que a jornada lhe irá convidar!

Mas quais riscos se a jornada nunca se dá? Que tipo de loucura é essa que envolve tudo e todos numa redoma, na iminência de se dizer: vá! Mas nunca de fato partir?

Quem adia a partida, jogando flores e acenando em despedida ao mundo que ainda não deixou, atrofia os músculos, virando no máximo um turista da própria vizinhança.

Era uma vez a minha casa, e quem a habita sou eu... esse é o meu jardim, a oitava maravilha do mundo em matéria de canteiros ajardinados - está aqui a minha margarida plastificada que não me deixa mentir!

Abandone o ser viajante! Se a ideia é viajar... viaje sem demora! Já, agora! Tenha a coragem e a bravura de exilar-se, e não perca tempo em carimbar passaporte nenhum!

Vaidade, somente vaidade travestida de cuidados extremos na instrução de alguém que poderia desenvolver o potencial para atravessar oceanos, mas que acaba por virar um mimado-babão, mal conseguindo escovar os dentes sem consultar um manual, na terrível expectativa de se afogar na espuma de eucalipto-fresh!

Ora, como se uma paisagem, uma alameda de árvores, um rio sinuoso, a textura branca da neve não merecessem mais atenção do que os pacotinhos embrulhados que vão na mochila do sujeito que deseja viajar.

Muitos mapas, muitas orientações, infinitas sessões de terapia para acalmar os ânimos sem que os ânimos sejam de fato testados.

Perde-se tempo precioso no exercício vaidoso de pentear os cabelos antes de deixar que o vento o embaralhe.

E nesse entreato autopiedoso, adia-se a viagem! Na justificativa de garantir o preparo de uma travessia, não se atravessa nada. Fica-se no mesmo lugar, num eterno dizer: já vou indo sem nunca ir.

Preparar uma viagem não custa mais do que uns breves alongamentos, o suficiente para as panturrilhas tomarem ciência das contrações que virão a seguir... o restante a própria estrada dará conta de aferir.

Se colocar em viagem é a única solução para se descobrir como viajar.

E andando para não-sei-onde, porque o próprio destino é o ato de viajar quem irá decifrar, ir percebendo aos poucos que espécie de viajante é esse que um dia decidiu partir.

Ponha-se logo na estrada, e sofra os riscos inerentes a todo aventureiro que se permite viajar.

Hoje, não se quer mais viajar, não se deseja mais ir de um lugar ao outro, um simples calçar os sapatos e tratar de enfrentar as intempéries do destino...

Hoje, cumpre-se, ao contrário, o desejo gigantesco de encampar epopéias até a lua, alegando que ao ser que viaja importa entender a sua enorme responsabilidade de viajar.

Eis um novo tipo de desbravador: o viajante de academia! Prepara-se até a exaustão para partir, mas morre no mesmo lugar.

Odes e vivas ao nosso novo Marco-Polo de diplomas! Vestem até capacete sideral no pobre coitado que mal tem forças para ir até a padaria da esquina, chupar um picolé de limão.

Antes de viajar, viaje! Escute o barulho dos pés pisando no chão! Sinta o vento no rosto! Passe frio! Sue de calor!

É a viagem que faz o viajante. Quem se prepara para ela nunca a vive, vivendo plenamente para discursar a respeito da própria coragem que nunca existiu... ou, talvez, tenha existido, só que para justificar o porquê se é corajoso, sem nunca ter tido coragem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário