quinta-feira, 28 de março de 2013

O COVEIRO DESPREZÍVEL...





O coveiro do cemitério municipal sempre agia de forma inflexível quando o assunto era suportar a choradeira dos que ficavam, todos – parentes e amigos -, entregues a uma ladainha de soluços e promessas de breve reencontro quando o caixão era baixado ao seu destino final – “Por que raios esses dementes esgoelam, torcendo e remoendo as tripas como se fossem porcos rumo ao abatedouro, se agora, de uma vez por todas, o desgraçado calou-se para sempre?” -, ele próprio, o coveiro, o mais desgraçado e desprezível dos coveiros do cemitério municipal, e, sem a menor dúvida, um dos mais cretinos homens que essa face da terra já teve a oportunidade de apresentar. Para ele, o coveiro, não havia um ser vivente da raça dos homo sapiens que merecesse vestir as calças que tinha, só dando devido valor ao Juca, seu cão vira-lata, que tinha o precioso talento de jamais discordar de qualquer coisa que ele, o coveiro, lhe pedisse ou dissesse. Um dia, porém, esse mesmo coveiro, num dos intervalos de sua árdua atividade como desencovador de covas, teve um mal súbito e morreu. Foi enterrado no mesmo cemitério no qual dedicara quase à totalidade da sua vida. Na ocasião do seu sepultamento, pasmem, houve um alvoroço geral. Toda a pequena cidade compareceu para ver o caixão do coveiro sumir por debaixo das camadas de terra atiradas pelas pás dos seus colegas de ofício. Foram sete dias de comemorações intensas em razão do desaparecimento oficial desse homem, um dos mais desprezíveis e assassinos da ética e da moral. Depois que tudo terminou, sua lembrança, a lembrança do coveiro, só ficou viva na cabeça de Juca, o vira-lata, que todas as noites aparecia no cemitério para dormir ao lado da lápide daquele que um dia fora o seu dono...

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