Um casarão antigo jazia abandonado na esquina
da Alameda Santos com outra rua cujo nome já não importa, importando somente
saber que o tal casarão antigo morria, e
ia morrendo exatamente como um pedaço de corpo gangrenando no meio de tanto
progresso e cores vivas dos edifícios vizinhos. O Executivo-das-Pernas-Ágeis,
um que sempre passava por aquela esquina há anos corridos, um dia ouviu
claramente um pedido de socorro, e era o tal casarão antigo quem falava,
pedindo ajuda, sofrendo por morrer de forma tão cruel, e justo ele que
testemunhara o crescimento da metrópole que agora o descartava sem qualquer
sentimento de piedade ou de justiça. O Executivo-das-Pernas-Ágeis argumentou
que estava com pressa e, driblando-se das lágrimas daquele que outrora deveria
ter sido um monumento imponente das gerações já idas, seguiu o ritmo ágil das
suas passadas. Uma vez longe do alcance das vistas do casarão antigo, o
Executivo-das-Pernas-Ágeis desejou secretamente que ele, o casarão antigo,
tivesse, como ele, pernas para poder fugir, e fugindo como ele sempre fugia com
suas ágeis pernas de executivo dos negócios urgentes, conseguisse escapar das
garras do vilão que por ventura viesse a lhe incomodar. Mas não houve tempo de
completar tal conjectura fantasiosa – afinal, casarões antigos, até onde se
sabe, não tem pernas, muito menos pernas ágeis -, porque um carro que ousou
desrespeitar o sinal vermelho trombou em cheio com o Executivo-de-Pernas-Ágeis,
levando-o rapidamente para onde ninguém até hoje ousou voltar para dizer se é
um bom lugar ou não. Morreu. E muitos outros morreram, os de pernas ágeis,
enquanto ele, o casarão antigo, continua ainda hoje a agonizar, pedindo socorro
para quem quer que seja, desde que tenha pernas para poder fugir.
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