Pouco se sabia dos hábitos nada ortodoxos dos ornitorrincos
da Ilha de Java que costumavam atravessar o pesado trânsito de Manhattan na
faixa de pedestres saltitando em uma só pata, respeitando rigorosamente a
cartinha dos marsupiais da Austrália que atentavam para o perigo dos imigrantes
clandestinos de se exporem ao pesado tráfego de taxistas malaios, todos eles
especialmente raivosos para com os ornitorrincos e toda a espécie de mamíferos
que botam ovos. Foi por esta e outras razões que não vem ao caso que a ativista
para assuntos bioéticos, Ludmila Alcântara, alugou um enorme Zepelin de ares
retrô ainda na cidade do Rio de Janeiro e, depois de posar nua e cumprir cansativa
agenda de sessões de autógrafos com o intuito de angariar fundos para a impressão
de manuais de relevância ambiental acerca da necessidade de preservação das
calotas polares árticas e antárticas, foi arriscar-se flutuando até alcançar os
limites aéreos da Big Apple. Mal se deu conta, porém, que veículos aéreos movidos
a ar comprimido não só necessitam de uma autorização especial para flutuar,
como também uma vez flutuando não valeria a pena deixar ao Deus dará a tarefa
de ir se dar no lugar desejado, já que o verbo flutuar difere na sua essência
semântica e geográfica de outro verbo, mais adequado para a situação, qual seja
o de viajar com destino a Manhattan a título de salvaguardar essa curiosa espécie
imigrante que sabe-se lá porquê é constantemente ameaçada pelos vingativos
taxistas malaios, denunciados em sua criminosa demência comportamental em relação
aos mamíferos que botam ovos pelos marsupiais aborígenes da Austrália. Sabendo
que muito provavelmente o enorme Zepelin não respeitaria orientações verbais de
trajeto, Ludmila Alcântara, a ativista para assuntos bioéticos, tratou de
relaxar o espírito engajado aproveitando a vista que se descortinava ao
horizonte esfumaçado dos trópicos tupiniquins. Soprada para os recônditos
infinitos do Atlântico, não hesitou em sacar da bolsa antigos folhetos
educativos contra o cruel comércio de pele de focas albinas colocado em prática
por esquimós do nordeste canadense, atirando-os por sobre as cristas das ondas
na esperança de que as correntes marítimas conscientizassem em levar para as
regiões afetadas por tão nefasto ato o importante apelo de ‘salvem as focas
albinas!’. Enquanto isso, numa visível atitude de desrespeito para com o
andamento das causas sociais, Elias Carneiro esparramava as banhas preguiçosas
no sofá verde-limão do quinto andar do seu prédio de apartamentos de classe média
paulista. Zapeava a televisão com a mão engordurada de batata chips, desatento
para o aviso do trovão que dizia: ‘vai chover, mas não na Cantareira!’.
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