Quando Archimedes da Ribalta morreu ninguém o tinha visto,
não naquilo que concerne a sua pessoa física, isso não! – Archimedes da Ribalta
era um homem simples de hábitos regulares e quem o quisesse acompanhar em seu
escrutínio diário e meticuloso que se colocasse como espectador na rua em que o
velho ator morava, todos os dias palco anônimo de suas idas e vindas, ainda que
sem aquele recurso dramático das cortinas caindo ao final sob o ressoar dos aplausos.
O que se sabe era que Archimedes da Ribalta era um excelente ator, mas isso só
ele sabia, mantendo em recluso segredo as suas habilidades histriônicas ao
recusar peremptoriamente receber plateia em seu pequeno teatro, tampouco
admitindo dividir o palco com companheiros de labuta. Só a ele e somente a ele,
Archimedes da Ribalta, era permitido habitar em seu recanto de imaginação
teatral. Em dias de espetáculo, as ruas adjacentes ao pequeno edifício de
esquina permaneciam lotadas de curiosos, todos do lado de fora como formigas
diminutas tremendo ao frio, esperando o momento exato em que as luzes se apagariam
para ver sair de seu interior aquele homem já prostrado em anos e todo enrolado
em seu cachecol, compelido a seguir em silêncio até sua casa. O cortejo o
acompanhava, imaginando qual tragédia acabara de interpretar. Quando finalmente
morreu, uma lápide em mármore raro foi erigida em sua homenagem, superfície
cujas linhas inscritas assim proclamavam em mudo lamento:
‘Aqui jaz Archimedes da Ribalta, tão bom ator que conseguiu
preservar o mistério de seu talento até o infinito das sombras poéticas. O que
importa que nunca o tenhamos visto?’
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