Certa vez uma pomba que tinha por hábito revoar o mesmo
mastro que servia de suporte para a bandeira flamejar suas odes nacionalistas
ao horizonte resolveu, por quebra de rotina, pousar lá em cima, aterrissando
suas finas perninhas de pomba na pequena bolota escorregadia pintada a ouro que fazia as vezes
de limite do obelisco, e, enquanto que os debaixo seguiam a vida no seu
costumeiro e tedioso galopar sem motivo algum para suspeitar do que viria a
seguir, ela, a tal pomba, acometida por uma indisposição qualquer, eriçou as
penas, estufou o peito, abriu o bico e soltou a goela em firme e retumbante
voz: EU SOU UMA POMBA! Todos que caminhavam pela praça central, vizinhos ao
mastro da bandeira flamejante e agora poleiro da pomba falante, interromperam
sua marcha e olharam para cima num misto curioso de sensações que combinava
primeiro um assombro por ouvir pela primeira vez um testemunho tão consciente
vindo de uma pomba, em seguida sobreveio o entusiasmo pela pomba ter rompido a
tradição muda de suas companheiras de infortúnio, acompanhado por certa dose de
inveja, afinal, antes fossem eles, enfincados que eram na proporção bamba de
duas pernas, a ter asas, para, lá de cima, gritar alguma coisa que fizesse eco
tal como a corajosa pomba conseguira realizar, e, por fim, uma avassaladora
melancolia se abateu por todos os da praça, piedosos pela tal pomba finalmente
saber que era uma pomba e, enfim, ter de lidar com esse fardo de consciência
absoluta até o fim de seus dias... agora dias, como bem sabia, de pomba...
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