sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Fábulas: # A metafísica invertida...

O tocador de fagote acordara com a cara meio enferrujada, toda ela pintada num tom terral. Ao escovar os dentes percebeu que o pescoço havia se alongado. A verdade é que ele estreitara nas extremidades, encompridando as tripas e afinando a circunferência. Uma vez que os pés eram coisa do passado, tinha grandes dificuldades para andar - somente sobrava-lhe claudicar entre pulinhos de um lado para o outro. Sua língua já não mais era um pedaço de carne livre entre os dentes – já não havia dentes! -, mas uma protuberância de metal rígido em forma de serpente cuspida para além dos domínios orgânicos. Quando falava o que saía não eram palavras, mas uma espécie de tosse seca e aveludada expelida pelo topo da cabeça, ou o que antes se sabia por uma cabeça, já agora feita a imagem e semelhança de um pequeno vulcão forjado à cobre. Ele era todo um organismo que se despedia dos fluxos biológicos e ganhava terreno rumo ao engessamento das partes. Enquanto isso o fagote, enjaulado na sua capa protetora, começava lentamente a se perguntar quem era ele, de onde vinha... e para onde ia.

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