domingo, 8 de fevereiro de 2015

Fábulas: # A Loja dos Suicidas...

Um suicida entrou na loja de artigos para suicídio e perguntou ao atendente se a corda da forca era de qualidade, ao que recebeu como resposta que era sim, protocolada, inclusive, pelo órgão público que regia a satisfação dos consumidores para produtos vendidos no comércio varejista, e, ainda assim, havendo qualquer problema de fabricação, que voltasse imediatamente que a troca seria garantida, mas que duvidava peremptoriamente de que o material fosse falhar, uma vez que ontem mesmo havia vendido o mesmo produto para um velho hipocondríaco cujo nome já aparecia na sessão de obituários do jornal, veja, aqui está o obituário para que não me deixe passar por mentiroso, ótimo então, disse o suicida, mas e quanto ao patíbulo, isso não fornecemos, é de responsabilidade do consumidor providenciar onde pendurar a corda bem como uma cadeira ou coisa que o valha para equilibrar-se a fim de desequilibrar-se depois para aí sim pender pendurado pelo pescoço e enfim suicidar-se, mas isso é muito difícil, alegou o suicida, não é possível que alguém ajude-me a realizar tal procedimento, alguém da loja mesmo, quem sabe até mesmo o senhor que já está bastante acostumado com os mecanismos de incentivo da prática alheia de se ceifar a vida, definitivamente não, meu senhor, nesse caso eu me tornaria assassino, o que é, evidentemente, absurdo, uma vez que eu apenas ofereço produtos para que as pessoas se assassinem deliberadamente, o que me enche de satisfação e orgulho, uma vez que me sinto bastante realizado quando alguém decide mandar uma banana para essa vida sem sentido e sem cor que por sabe qual lá motivo nos acostumamos a amar, o senhor fala como um verdadeiro suicida, é exatamente isso o que penso, pois acha que nunca tentei me suicidar, evidentemente que sim, e várias vezes, e por que nunca o conseguiu, é essa pergunta que martela a minha cabeça dia e noite, todas as vezes em que tento engolir um veneno, cortar os pulsos, meter uma bala na cabeça, alguma coisa acontece que impede a minha ida ao além devolvendo-me a esse desgraçado ao qual já acostumei-me a ser, não seja por isso, eu poderia muito bem empurrá-lo do parapeito do meu apartamento, são quinze andares, aposto que ao chegar lá embaixo o senhor já não mais existiria, ou existiria somente a vossa carcaça estatelada ao chão, mas aí o senhor é quem se tornaria um assassino, pois eu não me importo, uma vez que logo depois seria eu a dizer adeus à vida ao fazer uso dessa corda que teria de encontrar algum lugar para amarrar e depois equilibrar-me numa cadeira ou coisa que o valha e depois desequilibrar-me para aí então pender pendurado com o pescoço asfixiado, o senhor é muito gentil, vamos fazer assim então, eu o espero até conseguir enforcar-se, depois, se tudo der certo, eu me atiro janela abaixo, poderia ser assim sim, mas, se o senhor não se importa, eu gostaria de vê-lo morto primeiro, isso me daria um empurrãozinho final, o ânimo decisivo para dar cabo da minha própria vida, então o seu desejo é matar-me jogando-me janela abaixo, de forma alguma, meu senhor, não me tome por outra coisa que não sou, meu desejo é ajudá-lo a se matar, uma vez que o senhor mesmo foi quem confessou que há tempos empaca nisso e não consegue matar-se, pois isso é o que eu tento fazer, afinal, sou eu quem vende artigos para suicidas e não o senhor, disso não posso contrariá-lo, então ponha-se daqui para fora e não me aborreça mais, farei isso sim e desculpe-me por aborrecê-lo, e ficaria muito grato caso o senhor soubesse de uma vaga para trabalhar como vendedor nessa sua loja de artigos para suicidas e pudesse eu, quem sabe, vir a ocupá-la, para isso acontecer teria que me matar, meu senhor, a loja só tem vaga para um único vendedor que sou eu, não seja por isso, para que essa arma, não se assuste, eu só vou puxar o gatilho, ajudá-lo a se matar, exatamente como o senhor sempre o quis, mas isso o tornaria um assassino, e qual é a diferença entre matar os outros por tabela e matá-los diretamente, a diferença é enorme, pois eu não vejo a coisa assim e além disso eu preciso de um emprego, portanto, foi um prazer conhecê-lo meu senhor, e tenho certeza de que a corda me seria muito útil caso fosse eu a querer aparecer amanhã nas páginas dos obituários...

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