quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Fábulas: # O Árido Fim de Guilhermina Gólgota...

Encontrou-se a solução para as torneiras secas: Guilhermina Gólgota. Bastava a cantora lírica que lembrava garganta no nome soltar o gogó para fazer verter água pelos canos. E Guilhermina Gólgota fora durante muitos anos requisitada aos mais diversos fins, transformando desertos em represas caudalosas, riachos em corredeiras espumantes, poças em lagos de margens largas, e até mesmo emprestando suas árias e arpejos às campanhas dos políticos que utilizavam de seu nome para dizer que quem tem Guilhermina dá-se ao luxo de dispensar os labores invisíveis de São Pedro. Mas esqueceram-se de que é também da qualidade do ser humano - e Guilhermina Gólgota não furtava-se de tal alcunha imposta pelo destino -, secar. E Guilhermina, a medida que o tempo passava, ia ela própria secando, murchando feito uma uva-passa de ceia de natal. E embora sua voz ainda permanecesse altiva e eficientíssima no cumprimento da tarefa que lhe deu prestígio, chegou o momento em que a aridez subiu uma oitava e lhe surrupiou a alma, e junto com ela a garganta. Desde então os tempos de augúrio vaticinado pelos pessimistas fez-se palpável. E já não há agora um único miserável esperançoso que debaixo do chuveiro inoperante não tente imitar o zelo operístico de Guilhermina Gólgota numa triste expectativa piedosa de que alguma gota possa compadecer-se desse nauseabundo fedor digno de alguma apoteose apocalíptica
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